Você
sabe do que Renato Russo está falando, sabe que o resto é imperfeito e mesmo
assim não consegue parar de escutar a música. Volta nela quando acaba e,
enquanto ela dura, vira um momento fugaz na sua imperfeição, que você queria
que fosse eterno.
Entra
Titãs e você sabe que é "pra sempre enquanto durar" e que "pede
somente o que puder dar". Porém, mais uma vez a música acaba e vocês marcam
algo. Não você e o Titãs. Você marca algo com ela ou com ele, mais precisamente
às 14h23m17s.
- Está
bem, 14h23m17s.
- Esquece,
vou me atrasar.
- Que
horas, então?
-
14h25m25s.
- Está
bem.
Você toma um banho, 13h29m16s. E porque não ouvir mais uma música? Você
quer colo, fugir de casa, dormir aqui com vocês. Então, descobre pela centésima
vez que é preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã, afinal, se você
for parar para pensar, não há. Agora, quer ouvir essa nova música
inteira por uma hora, mas ela tem 5m8s e o tempo escorre pelas suas mãos. Você
sai de casa, pega o metrô às 14h2m10s.
O
trem para e você pensa que vai se atrasar mais do que imaginou. Talvez chegue ás
14h26m7s. Começa a reparar nos pulsos onde repousam relógios que marcam horas
desreguladas; um está marcando 14h10m3s, outros estão marcando 14h10m4s e ainda
há aquele de 14h10m6s. Uma ousadia com o tempo, o relógio oficial, horário de
Brasília, marca apenas 14h10m2s.
Enfim,
a garota – ou o garoto, ou você – chega às 14h23m47s. Beijam-se relativamente
rápido e saem para comer algo rápido também. Não há muito tempo.
- Escolha
um lugar,
- Que
horas são?
- 14h33m25s.
- Já?
Saíram
andando rápido, almoçaram.
-15h2m48s.
Melhor ir para o seu ponto.
- Tem
razão.
A
esse momento o farol fechou. Não qualquer farol, mas o farol mais demorado da
região fechou. Olharam-se por um momento, os relógios marcavam 15h8min, mas um
abraço ignorava os ponteiros.
Que
parte difícil de explicar esta; é bem parecida com o momento da música, mas
você sabe que vai acabar e que não poderá repeti-la. Deseja cada vez mais aproveitar
aquele momento. Extrai tudo o que pode dele e consegue senti-lo no vento, no
sol, no calor e nos corpos juntos.
E dizem que o momento fugaz que deseja ser eterno são as grandes felicidades
da vida. Será verdade? A felicidade é um momento fugaz que luta para ser
eterno? Um momento tão bom, uma felicidade tão plena, que não pode permanecer
mais do que alguns minutos, caso contrário se esgotaria em si mesma? Uma
felicidade que desembainha uma espada e escudo, e mesmo assim não vence.
Que loucura são esses momentos que desejam ser eternos. Então, a felicidade
não ganharia? Se for assim, por que ainda guardamos esses momentos por tanto tempo
em nossas mentes até que ele soe ridículo? Fernando Pessoa diria que todas as
cartas de amor são ridículas. Seriam elas ridículas por que estão imersas
nesses momentos fugazes, que querem ser eternos? Também não podemos explicar
esses momentos por se tratarem de um sentimento. Se alguém puder explicá-lo e,
ainda assim, outro alguém puder entendê-lo, nunca será em sua totalidade. O
momento não se retém nos dedos da pessoa que vive e muito menos da pessoa que
não estava por ali.
Se
te perguntarem, você pode dizer isso mesmo. Momentos eternos e felizes são
aqueles fugazes que lutam para serem eternos, que são ridículos e que são uma
faísca de felicidade. Você também pode explicar que cada faísca de felicidade
compõe a sua vida e que cada momento fugaz eterno na sua mente aumenta essa faísca,
transformando-a em um raio de luz.
Cada
raio, por sua vez, dá sentido a sua vida. Poucos são os seres e situações
capazes de lhe proporcionar esses raios. Você dirá que quando estes poucos lhe
aparecem é necessário saber lutar ao lado da felicidade para que eles durem não
só na sua mente, mas na mente do maior número de pessoas quanto for possível.
Os
raios tem um alcance incrível, muitas vezes não são necessárias palavras quando
eles acontecem. Se elas fossem necessárias, você poderia perguntar para a outra
pessoa se o momento foi fugaz o suficiente para que ela desejasse ser eterno. Mas
não há necessidade disso.
Todos
os momentos que querem ser eternos são imperfeitos, ridículos e fugazes. Não
seriam momentos fugazes que lutam para serem eternos se não fossem ridículos e
imperfeitos. Duvidam? Tentem explicar qualquer momento fugaz eterno para alguém
e peça que o compreenda. A maior parte deles são trechos tão pequenos que
poderiam não ter acontecido. E se não tivessem?
O Abraço da
história se soltou, o farol abriu e um suspiro foi lançado ao ar. 15h9m1s.
- Esse foi
um abraço muito bom. – Disse sorrindo.
- Concordo
plenamente.
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