31 de maio de 2014

A placa da minha cidade


Sou um ex-cidadão de Lugar Nenhum. Quando digo isso, ninguém acredita. Outro dia expliquei a um amigo meu como era Lugar Nenhum, contei como lá era um pouco triste, tinha vários blocos de casas cercados de arames farpados e Lugar Nenhum parecia um monte de mini-prisões. Porém, um detalhe que sempre me encantou era a pitangueira debaixo do cimento, o encanto de ver árvores brotando da calçada era quase como um alívio.
Não sinto falta de Lugar Nenhum, mas, mesmo estando em outro lugar, minha casa sempre será em Lugar Nenhum. Parece até desastroso dizer, mas as nuvens de lá me cercavam e o pior não era viver de sonhos, o pior era que também tinha político de Lugar Nenhum. Ninguém poderia entendê-los, uma vez o Zé Ninguém resolveu competir com o Mais Alguém.
Falavam que iriam dar nome, dar igualdade e transporte em Lugar Nenhum. Disseram que iriam dar educação em Lugar Nenhum. Prometeram que iriam acabar com a fome e a corrupção em Lugar Nenhum. O povo acreditava desacreditando, ficava na agonia da espera para saber se havia acertado o palpite, se dessa vez seria diferente. Isso ocorria até esquecerem que estavam esperando. Das milhares de propostas, o povo de Lugar Nenhum lembrava-se de no máximo duas. Quando calhava, era justamente uma dessas que o então prefeito João Só Fala conseguiu realizar. Mas o Ibope dizia que o Mais Alguém estava ganhando com altos índices na pesquisa daquele ano. Perguntavam nas ruas:
- Terá segundo turno?
- Quantas propostas irá concluir?
- De quantas você se lembrará?
- Quem dá mais?
E outros gritavam:
- Vendido!
Também não passavam despercebidos os comerciais:
- Esqueça João Só Fala, ele rouba, mas não faz. Vote em Mais Alguém!
- Lugar Nenhum, uma cidade de todos!
É claro que diante de tão poucas perspectivas de mudanças, eu não sabia ao certo se deveria acreditar no eterno Lugar Nenhum do progresso. Acabei mudando de cidade, mas preciso dizer que Lugar Nenhum já foi Algum Lugar e disseram-me que Algum Lugar já foi melhor. Não sei. Sei que este nome já esteve gravado na placa de boas-vindas da cidade e quem a pregou foi o povo. Mesmo assim se esqueceram de melhorar Algum Lugar, então, Algum Lugar passou a ser Lugar Nenhum com a nova gestão. Lugar Nenhum e nada mais. Ainda fico pensando nessas histórias e na placa da minha cidade. Talvez se tivessem colocado "Bem-vindo a São Paulo" teria dado certo. Quem sabe? Quem sabe...

29 de maio de 2014

No Bico da Coruja #3 - Restaurante por kg com Pizza perto da Fnac


Quem passa pela rua atrás da Fnac provavelmente nunca se deu conta de quantos restaurantes existem por ali. Hoje vamos falar justamente de um deles, que fica na esquina da Alameda Campinas com a Al. Joaquim Eugênio de Lima. Não é fácil reparar no Restaurante Loreto quando estamos distantes e do outro lado da calçada, mas ao sair da Fnac e atravessar a rua, indo em direção ao número 877, logo vemos as paredes de vidro do não tão pequeno e nem tão grande Loreto.



O Loreto está no Bico da Coruja hoje especialmente porque o restaurante é dono de uma variedade de comidas, desde Sushi a churrasco. Mas não é só isso, a saber, até agora, o Loreto é o único restaurante da região que tem todos os dias pizza por kg no cardápio. Nem precisa mencionar que a pizza de lá é muito boa. Além do mais, há um motivo extra para indicar esse restaurante antes da sexta-feira; ele está entre os dois restaurantes que, ao invés de oferecerem gelatina de graça, dão um brigadeiro de copinho.

E, convenhamos, se você é um daqueles que também acham que a melhor hora do dia para comer doce é depois do almoço e que sexta é dia de pizza, não deixe de passar nesse lugar. Advertimos, porém, que o lugar não é o kg mais barato da região - o que não implica que seja o mais caro -, lá, o preço de 100g é R$4,55, não sendo difícil gastar um pouco mais com tanta variedade. Na sexta-feira é provável que você encontre maminha ao molho mostarda, yakissoba, salmão, frango, etc. Também é importante dizer que o ambiente é agradável, mas lota rapidinho e eu digo rapidinho mesmo, porque quando estamos no meio do almoço, mais ou menos meio dia e pouco, quase todas as mesas já estão ocupadas.


Restaurante Loreto
Endereço: Alameda Campina, nº 877
Preço: 100g - R$4,55
Hórario de funcionamento: Segunda à sexta, das 11h30 às 15h
Selo Gordice de Sexta-Feira da Coruja!

27 de maio de 2014

O ABC dos deficientes visuais



Como as instituições escolares lidam e os preparam para a vida

Por: Bruna Meneguetti - Do Alto do Poste


Criadora do canal “Fila Preferencial” no Youtube, Victoria Schechter fala nos seus vídeos um pouco do universo do deficiente visual. Seu problema é genético e hoje ela tem 5% da visão, mas pode enxergar claramente o problema das instituições de ensino ao lidarem com os deficientes e deixa isso bem claro no vídeo “10 coisas que os cegos odeiam”.
     
      Victoria já estudou em três colégios diferentes e apenas em um ela encontrou o auxílio que precisava. “Eles não faziam o essencial, não querem um aluno com deficiência porque dá trabalho, mas são obrigados a aceitar”, conta Victoria, se referindo à Lei Federal de 1999 (nº 7.853/99), que prevê crime caso haja a recusa por parte das escolas em aceitar qualquer pessoa que tenha algum tipo de deficiência. Mas, para Victoria, é nítida a prioridade de “investir em dez que vão passar na Fuvest, em vez de um que vai dar trabalho”.
Ela não consegue sequer imaginar como seria essa situação na escola pública, situação que é clara para o estudante Bruno Gabriel Moreira, de 13 anos, que estudou em uma das Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEI) e pode falar abertamente: “eles não tinham nenhuma especialização com deficiente visual”.
Bruno, assim como a Victoria, começou a ter problemas de visão aos três anos. O quadro dele se desenvolveu devido a um câncer que foi controlado, mas que acarretou na perda total da visão.  Hoje ele está no oitavo ano e estuda no Instituto de Cegos Padre Chico, mesma instituição de ensino de Patrick Henrique de Jesus, de 18 anos.
Um câncer levou a visão do estudante Moreira
Patrick enxergava bem até os cinco anos e estudou em uma escola pública em Diadema. Ele esclarece que o professor não conseguiria dar atenção para o deficiente nem se quisesse. Devido ao elevado número de alunos na sala (cinquenta, mais precisamente), não havia como auxilia-lo da maneira correta.
Essa situação não está presente no Instituto Padre Chico, que hoje conta com 130 alunos, a maioria entre 4 e 16 anos, distribuídos em 11 salas, cada uma com, no máximo, 15 alunos, obedecendo aos critérios da Secretária da Educação Centro-Sul de São Paulo. O Instituto é filantrópico e conta com a doação de pessoas físicas e jurídicas, além de parcerias com empresas e isenção de impostos para manter-se. Ninguém trabalha como voluntário, os educadores são registrados e precisam conhecer o braile para lecionar, apesar de familiares sem deficiência dos cegos também estudarem lá.
            “Se eu falar para você que um aluno cego é um aluno comum como outro que não tem deficiência e que a pessoa que deve se adaptar sou eu, você acredita?”, pergunta a professora Luciana Ruiz quando questionada sobre a questão de conciliar as aulas para os dois grupos de alunos.
            No Instituto são priorizadas a capacitação e autonomia dos estudantes. Eles são treinados para se orientar através do som, temperatura e ventilação, sendo que nenhum deles faz o uso da bengala lá dentro.
            Durante as aulas vários instrumentos são utilizados para explicar pelos outros sentidos o que deveria ser explicado pela visão, como o Soroban (instrumento de contas chinês), o Multiplano (usado para desenhar figuras geométricas), além de desenhos feitos em relevo de células, planetas, etc. Outro aparelho muito importante no auxílio da aprendizagem é a máquina Perkins, que produz textos em Braile.
Luciana mostra o instrumento de contas Chinês
"Não conseguiriam dar atenção nem se quisessem"

   
Caderno escrito através da Máquina Perkins
         Cada máquina custa em torno de dois mil a dois mil e quinhentos reais. Pelo alto custo e por ser um material para a minoria, a Máquina Perkins é difícil de achar, sendo um exemplo de como os recursos usados pelos cegos nem sempre são de fácil acesso.
Os audio books também funcionam como reurso de leitura para os cegos e, assim como a Máquina Perkins, encontra grandes problemas em sua distribuição. Pedro Millet, de 58 anos, membro da Fundação Dorina Nowill e desenvolvedor do aplicativo de audio book Daisy Reader, nos conta que o grupo Daisy é formado por 30 representantes de instituições do mundo todo, que são voltadas para a distribuição do livro acessível. A lei vigente do direito autoral diz que nenhum país pode exportar para outros um livro nesse formato, o que impede a acessibilidade das pessoas, limitando a circulação.
            “Obviamente a acessibilidade e educação está melhorando aos poucos, mas ainda há muito que melhorar. A adoção de material obrigatoriamente acessível para os alunos fez aumentar o número de estudantes cegos que frequentam a escola”, afirma Pedro.
            Não só a frequência dos alunos nas escolas aumentou, é notável também a existência de novas aulas e cursos, como as aulas de Atividade da Vida Autônoma (AVA) e o curso Orientação e Mobilidade, ambos oferecidos por diversos órgãos e institutos. No curso de Orientação e Mobilidade o adolescente que já pode andar sozinho na rua é orientado no período de seis meses a um ano, desenvolvendo quatro técnicas para poder andar na rua com autonomia.
            Durante este período, os cegos também são treinados para pedir ajuda as pessoas quando precisam. “Às vezes eu vejo um cego parado com uma bengala em uma esquina e alguém com muita pressa pensa que ele quer atravessar, pega no braço dele e começa a puxá-lo”, lembra Luciana.
            A fala de Luciana também é um dos itens do vídeo “10 coisas que os cegos odeiam”, da Victoria. Ela nos conta que vive se assustando com desconhecidos que pegam em seu ombro, assim como se assusta com pessoas que ficam gritando com ela.
             “A maioria das pessoas tem a intenção de ajudar. Não tenha medo de perguntar, assim você dá espaço para o deficiente responder se precisa ou não de ajuda”, diz Victoria. Patrick, que já fez o curso de Orientação e Mobilidade, afirma que a abordagem errada acontece porque a população não tem o hábito de conviver com o deficiente visual diariamente. “Eu mesmo oriento, pego no cotovelo ou no ombro e já indico como eu gosto de ser guiado”, afirma Patrick.





22 de maio de 2014

No Bico Da Coruja #2 - comida por quilo no Trianon

A Coruja visitou um restaurante japonês no primeiro episódio da sessão gastronômica do blog. Dessa vez, os aventureiros que vos escrevem visitaram um paraíso perdido nos arredores da avenida mais paulista de todas.

Ao lado do Parque Trianon, na Rua Prof Otávio Mendes, 37, oculta por entre os prédios comerciais e de escritório, há uma galeria recheada de restaurantes e lanchonetes que deverá ser fonte de muitas recomendações ainda. Logo na entrada, encontra-se Sabor e Poesia Grill e Light, um dos melhores "quilos" da região.

Com opções variadas, indo desde sushis a saladas, passando por uma gama enorme de coisas gostosas. Um dos diferenciais do estabelecimento são as carnes, preparadas pelo simpático Gil. O ambiente é bem agradável costuma ser vazio antes do meio dia. A vista para o parque é uma ótima pedida para apreciar a comida.


O preço de 100 gramas é R$4,99 e o navegante desavisado que vai ao Sabor e Poesia deve tomar cuidado com o tamanho do prato e com a quantidade de tentações que se oferecem, pois não é difícil perder a mão na hora de se servir e pegar muito mais do que deveria.





Sabor e Poesia Grill e Light
Endereço: Rua Prof Otávio Mendes, 37, loja 44 (a galeria também tem uma entrada pela Av Paulista, 1499)
Preço: 100g - R$4,99
Funcionamento: segunda à sexta
Selo de qualidade do Bico da Coruja: Excelente!

14 de maio de 2014

No Bico da Coruja #1 - Japa por kg na Augusta

O coruja no poste está com uma nova sessão! No Bico da Coruja falará de lugares para comer em São Paulo. Os redatores principais serão a Bruna Meneguetti e o André
Cáceres - com algumas participações de outros redatores do Coruja -, que decidiram impor a si mesmos um desafio: comer por um mês em lugares diferentes na região da Paulista.

Ao verificar que o desafio de achar lugares bons e baratos não se mostrou difícil, os dois resolveram compartilhar os seus restaurantes prediletos, os locais mais agradáveis, os mais baratos e também os piores, que não são recomendados a ninguém.

Mas a Sessão No Bico da Coruja não se dedicará somente à região da Paulista, mas toda a sorte de restaurantes bons que os redatores puderem conhecer em São Paulo. Para alegria dos leitores, esses restaurantes costumam ter um preço que cabe no bolso e também são localizações fáceis de chegar (geralmente perto de metrôs).

Gostaram? Então acompanhem já essa nova Sessão!

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Por: Bruna Meneguetti


No Bico da Coruja esteve em um restaurante muito conhecido na região da Consolação; o Asia House. O Asia é um restaurante por kg, japonês e barato. Pode até parecer estranho, mas o Asia foi um dos meus primeiros achados com o André Cáceres, apesar de ficar justamente na travessa mais conhecida da Paulista.

O Asia fica na Rua Augusta, nº 1918, no quarteirão abaixo do Conjunto Nacional. O custo de 100g de comida é R$5,71 e há uma variedade imensa de todo o tipo de comida japonesa - até mesmo com um quê de pratos chineses -, além da sobremesa grátis, que é uma espécie de banana enrolada com uma massa e depois caramelizada. Para quem não tem muita noção de preço, no Asia House os dois degustadores sempre comeram muito bem e saíram de lá pagando entre 15 e 25 reais.
O ambiente do lugar é muito agradável, com dois pisos, o Asia por enquanto tem o espaço suficiente para acomodar todos os seus clientes. No piso superior há 70 lugares, com mesas grandes e juntas, sendo ideal para levar um grupo grande de amigos. No piso inferior há uma quantidade menor de mesas, mas elas só lotam a partir do 12h20.

Depois do meio dia e meio é provável que você encontre menos lugares e filas maiores para conseguir pegar os sashimis, hot rolls, tempurâs, cebolas fritas, lombos caramelizados, todos os tipos de sushi, e todas aquelas comidas japonesas que nunca lembramos ou conhecemos o nome.

O Asia House deixa muitos quilos de japas e rodízios no chão com sua variedade, preço acessível e ambiente agradável. Ninguém te olhará torto se não souber manusear os hashis ou não seguir a etiqueta, afinal todos os clientes estão com pressa, famintos e ansiosos por uma boa comida japonesa. Importante avisar também que o Asia House abre de segunda à sábado, das 11h às 15h30, tendo o selo de qualidade do Bico e estômago da Coruja.

Asia House
Endereço: Rua Augusta, nº 1918
Preço: 100g - R$5,71
Hórario de funcionamento: Segunda à sábado, das 11h às 15h30
Selo de qualidade do Bico da Coruja: Excelente!

11 de maio de 2014

O horror do poeta


O horror do poeta é ser lido por alguém que saiba que sabe ler. Não pelos ávidos leitores inocentes que não têm a prepotência de afirmarem saber ler, mas pelos que negam a ingenuidade em nome de uma pretensa sabedoria que dizem ter. Não pelo jovem tolo que tem a mais alva certeza de que não há certezas no texto, mas pelos estudiosos que, do alto de suas arrogâncias conseguem encontrar certeza onde o poeta só vê instabilidade.

Ah, os professores de português, escondidos por detrás de suas espessas barbas e seus grandes óculos, por mais que não saibam que têm barba ou usam óculos. Quem são eles para alegar que não têm barba e óculos se eu os vejo claramente em minhas minuciosas análises? Essas criaturas derrubam o poeta do céu e o puxam para seu mundo regulado e opressor. Sufocam-no enchendo suas bocas de palavras inexistentes e suas penas de metáforas impensadas. Interpretam o que não foi dito e suprimem o sentido mais puro.

Enquanto o pequeno sem luz maravilhado com o poeta não sabe ser o mais feliz entre os infelizes leitores, o demônio gramatical, em seu inferno semântico, lexical, semiótico e morfológico, despedaça a grandeza do poeta em nome das verdades que vomita ao iluminar os alunos. Esse, meus caros, é o horror daquele que, desesperadamente, escreve para ser lido e não compreendido e esmiuçado.

P.S.: texto escrito durante uma aula de português.

8 de maio de 2014

Juventus completa 90 anos com festa e pessimismo de torcedores e ídolos

Por André Cáceres e Bruna Meneguetti

Quando a Rua Javari é tomada por uma onda de camisetas grená, todos sabem que o
Juventus vai entrar em campo. Na manhã do dia 13 de abril, domingo, entretanto, a
ocasião era mais especial que apenas um mero jogo de futebol. O clube mais
carismático da cidade de São Paulo estava para completar 90 anos de fundação.


 Apesar da festa, o time encontra-se em um dos momentos mais críticos de sua história.
O último jogo do moleque travesso antes do aniversário foi um empate sofrido diante do
fraco Cotia pela última rodada da série A3 do campeonato paulista. Por muito pouco, a
equipe não foi rebaixada para a quarta divisão.

 "Acho que fica cada vez mais difícil a situação do futebol e de quem manda no clube
para querer continuar com o time e voltar a ser o que era. Precisa de uma renovação,
administração e cuidado com o marketing”, explica Hamilton Kuniochi, o maior
colecionador de camisas do time, com 120 peças, e dono do blog “Manto Juventino”,
onde mostra suas preciosidades. O torcedor exibiu sua coleção na sede social do clube,
num evento em comemoração aos 90 anos do Juventus. “ O time tem potencial, hoje o
estádio está cheio mesmo nessa situação”, diz Hamilton se referindo ao público que
encheu as arquibancadas.
Hamilton Kuniochi, o maior colecionador de camisas do Juventus

 Entre os 1088 torcedores presentes, estavam heróis do passado prestigiando a atuação
do Juventus, porém sem esconder o desânimo. Gilberto Aluísio Junior, mais conhecido
como Nenê, começou a jogar com 18 anos e parou duas décadas depois.
 "Hoje vou fazer 70 e, quando desço a Rua Javari, ainda sinto que estou indo treinar. Só
depois cai a ficha que essa fase já passou", afirma o ex-jogador, que fez dupla de zaga
com Oscar Amaro da Silva durante os anos 60 e, juntos, chegaram a marcar Pelé e
Garrincha em um jogo-treino contra a seleção canarinho às vésperas da Copa do Mundo
da Inglaterra, em 1966.

 “Perdemos de 6x0”, relembra Nenê, “mas aqui na Javari a gente ganhava do
Palmeiras, São Paulo, Corinthians, só perdia do Santos de Pelé. O time era muito unido,
o treinador Milton sabia como levar os nossos jogadores ao máximo de suas
capacidades”, acrescenta, orgulhoso ainda ao lado de Oscar, que também veio ver o
jogo.
Nenê e Oscar, dupla de zaga do Juventus nos anos 60

 Oscar foi campeão pelo Juventus em 1971. Hoje, ele é técnico e diretor de futebol e,
assim como Gilberto, também fala sobre o clube ser um espaço de encontro social.
“Sempre são os mesmos que vêm aqui. Sabemos quem são os nossos amigos ou quem
são apenas conhecidos”.

 Uma figura singular, presente em mais de dois terços da história do clube, e ainda mais
marcante no espaço social é o massagista Elias Pássaro. Com 85 anos, dos quais
dedicou 61 de trabalho para o Juventus, ele traz no semblante o cansaço de quem se
empenhou durante uma vida inteira ao moleque travesso e afirma que o time mudou
muito. “Antes tinha mais garra e as pessoas não pensavam no dinheiro", lamenta. “hoje
não chega aos pés do que era antigamente”, completa Elias.
Seu Elias, massagista do Juventus há mais de 6 décadas

Mas se o clube tem grandes ídolos e personagens do passado, as novas gerações
também marcam presença no estádio e na internet. A Web Rádio Mooca foi criada em
2011 para cobrir com qualidade as informações do time e também do bairro. Há três
anos no ar e sem vínculos com o Juventus, a rádio apresenta números expressivos de
audiência, chegando a ter mais ouvintes sintonizados que pessoas nas arquibancadas.

“O time tem tradição. Até brinco que a história do Juventus e a história da Mooca
estão muito ligadas uma a outra. É triste, quase caiu para a quarta divisão do
campeonato paulista”, diz Wagner Hiroi, que se tornou juventino quando passou a  transmitir os jogos da equipe, diferente do narrador Raony Pacheco: “eu matava aula
pra vir aqui, venho desde os 10 anos. A rádio foi um acaso, eu era torcedor de ficar
atrás do gol”, lembra. “O que nós oferecemos não tem na grande mídia. Com relação
ao bairro, virou um ponto de informação, porque todas as transmissões são da região
da Mooca. Assim, as pessoas começam a participar mais, sabem do dia a dia da
região e conhecem mais do clube.”
A equipe da Web Rádio Mooca


“Eu senti que aqui tinha uma brecha, não havia ninguém cobrindo. Por ser da Mooca,
logo pensei em criar e procurar parceiros”, conta o idealizador da rádio, Marcelo
Santos. “Tem dias que temos mais ouvintes do que pessoas no estádio. O retorno de
audiência vem crescendo ano a ano. O Juventus é o primeiro time de muitos e o
segundo de quase todos”, acredita.

Apesar de todas as dificuldades, a torcida juventina continua enchendo o estádio
surpreendentemente. Entre as faixas presentes na arquibancada, os dizeres “ódio eterno
ao futebol moderno” destacam-se como lema da organizada Ju-Jovem. Outra mensagem
interessante é a que diz “Mooca é Mooca, o resto é bairro”.

 A identificação do Juventus com a Mooca é de uma singularidade notável. Não existe
uma ligação tão forte assim entre um time e um lugar em todo o Brasil. “A Mooca é o
bairro mais bairrista de todos”, brinca Hamilton. “Hoje, as ligações de bairro geralmente
vão desaparecendo, as lojas começam a virar prédios, mas aqui tudo isso acabou se
tornando uma forte ligação afetiva”.

 Hoje, a Javari já não tem mais a grandeza de outrora, mas manteve o charme dos
tempos do futebol romântico e tornou-se um evento social, assim como um marco da
resistência ao futebol mercantilizado. "O futebol moderno prejudica o Juventus.
Primeiro porque o jogador vendido não representa uma comunidade, com isso nós
vemos os times mais preocupados em fazer mídia e não em formar uma torcida".

 Tanto os antigos heróis, quanto o maior colecionador compactuam com a mesma ideia
sobre o Juventus trazer o futebol antigo. “Na arena de hoje não pode mais gritar e pular,
porém aqui pode e as pessoas vêm buscar isso. Elas podem circular, encontrar amigos e
apoiar com fervor o seu time”, acrescenta Hamilton, acrescenta Hamilton, que logo
depois desaparece na gigantesca fila dos canollis, feliz por conhecer a magia daquele
estádio e daquele time que completava 90 anos.

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