22 de janeiro de 2016

Avenida dos Encontros


Ela estudou numa cidade vizinha. Como eu. Ela é do Ipiranga, viveu às margens plácidas. Eu, nem tanto, tortuoso, mas morei próximo das nem-tão-plácidas-e-belas margens do Tamanduateí. Ela, teatro e letras. Eu, desenho e acordes. A distância nunca foi grande em uma metrópole em que todos estão tão colados e tão indiferentes, tão juntos e tão afastados, em contato físico sem aperto de almas. Mesmo sem se conhecer, era como se já fôssemos íntimos há eras, há vidas, há várias avenidas. Eu desvio o olhar. Ela, sorriso a me encantar. Eu parado feito bobo. Ela dançante como a luz que atravessa uma queda d'água em pleno meio dia. Eu, gracejo sem talento Ela, toda a graça do momento. De graça, nem o ar da avenida.

Passos apressados. De tão paulista, é o mundo todo junto. E nem o planeta inteiro me faria distrair daquele par de olhos, daquela boca que me consome, das curvas que, feito serra litorânea, vão para lá e para cá e me jogam para onde querem sem a menor solenidade. Prudente, não me atrevo pelo Ipiranga. O tempo passa, balbuciando meses vazios, atirando para frente o inadiável. Porque não havia como não ser assim.

Forte era a atração que nos puxava. Santa era intensidade velada que levava um ao encalço do outro e outro aos braços de um. Adeodata. A Deus, a data? A data era especial. A maioridade do nosso platonismo nos arrebatava. Arremetemos tanto que finalmente arrematamos. Angariamos o que adiávamos. Numa travessa da avenida, atravessamos as nossas avenidas. E de tanto esperar, o entroncamento das vias gerou trânsito de beijos. Congestionamento de abraços.

Olhares, como motocicletas, passavam a milhão por entre os dentes, os ombros, o colo, as coxas. Os passos continuam apressados n'avenida da vida, mas a nossa rodovia segue lenta, contemplativa, regida pelo afeto e pela vontade de viver cada segundo como se o amanhã fosse apenas uma tela de Van Gogh estendida à nossa frente, iludindo os olhos com pinceladas espaçadas e firmes. Mareja os olhos. Arrepia os pelos dos braços.

Ela, Ipiranga, Jabaquara, Santa Cruz, Bela Vista, Paraíso, Jardins, República, Moema, Bom Retiro, Centro do meu viver.

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