Se há uma
palavra que possa descrever Tim Maia, essa palavra é: intenso. A intensidade
com que o cantor vivia cada momento de sua vida, quando tentava se sobressair
contra quaisquer dificuldades era sempre extrema. Os extremos na vida dele
também foram recorrentes: do jovem Tião entregador de marmita da Tijuca ao Rei
do Soul brasileiro em 1970 e, depois disso, ao seu declínio causado por si
mesmo - pela sua arrogância e seus excessos. Assim, Sebastião Rodrigues
Maia é descrito com detalhes, durante 2h20min na sua cinebiografia, baseada no
livro Vale Tudo - O som e a Fúria de Tim
Maia.
O filme
conta desde a sua infância até seu último verso cantado em seu último e
fatídico show no Teatro Municipal de Niterói, em 15 de março de 1998. “Vou pedir...”. Em seus primeiros anos,
na Tijuca, Tião da Marmita era o caçula dentre 11 filhos, e tentava buscar o
seu espaço no mundo. Desde cedo, lidava com situações que moldaram o seu
caráter explosivo e tão volátil. Volátil num sentido literal: de mudar de
opinião sem o menor pudor e voltar a uma opinião antiga num simples piscar de
olhos. Isso é visto claramente durante a exibição daquilo que foi chamado da
sua “fase racional”, quando Tim Maia virou um adepto da Cultura Racional.
Na
adolescência, a formação do quarteto vocal Os
Sputnicks parecia algo muito promissor, mas o tempo e alguns fatos
marcantes – como a morte do pai e “o dia
em que a música morreu” - mostraram que nem tudo seria fácil para ele. Mais
tarde, dos Sputniks saíram grandes
nomes da música, como Erasmo Carlos e Roberto Carlos, alguns personagens
presentes na vida de Tim. Talento não lhe faltava, mas, como ele mesmo diz, “Desde que eu saí daquele avião, parece que
todo o mundo à minha volta está querendo me sacanear”, quando viveu durante
um tempo em Nova Iorque. Durante o seu tempo lá, teve contato com as raízes da
música, as raízes do soul, da música negra; influências que lhe deram a
capacidade de compor tanto baladas românticas quanto seus suingues, ambos com
uma riqueza lírica que ia além das intensas batidas de guitarra e dos metais
que sempre tocavam exatamente o que Tim Maia queria - elementos marcantes na sua
música.
Tim Maia
ficou conhecido como o Rei do Soul brasileiro. Nesse quesito, o filme demonstra
todas as angústias, dúvidas e incertezas que acabaram influenciando as suas
letras, vindas do fundo de sua alma. Na película, estão os processos de criação
musical de Tim, que provam que ele simplesmente foi o que foi não pela
quantidade de músicas, pela sua obrigação de escrever algo novo. Pelo
contrário: ele não se importava, não via uma obrigatoriedade na música, algo
que o diferencia de outros cantores da época. Tim Maia escrevia com a alma, e
isso fez dele esse grande músico que até hoje toca nas rádios no sábado à
noite.
Sua vida
pessoal era um absoluto caos. Talvez por ter tido uma origem humilde, ele
pareceu sempre querer se provar alguém na vida. Não um simples mulato que não
tinha oportunidades, mas um mulato que poderia fazer o que quisesse e que ainda
teria sucesso. E assim foi. Seu brilhantismo musical acabou sustentando-o
durante todas as suas idas e vindas entre Rio de Janeiro, São Paulo e até mesmo
Inglaterra. Ao mesmo tempo que o seu ego e seus sentimentos imediatistas
queriam levá-lo longe, o mundo das drogas aparece no filme como o maior vilão
de sua trajetória. Um vilão que ele acolheu como seu aliado, mas que ao fim de
tudo mostrou-se extremamente danoso à sua saúde mental, física e musical.
A temática
séria tem em si momentos de alívio cômico, sempre presentes nas falas do
protagonista, que parecia ver tudo com um olhar meio desconfiado, e ao mesmo
irreverente. Momentos como a parte em que o cantor droga todos em uma gravadora
serviram para aliviar a tensão criada pelo seu sentimento de solidão extrema,
pelo qual grandes compositores já passaram. “Se por fora Tim Maia exibia aquela enorme casca de rinoceronte, havia
um coração mole por baixo daquilo tudo”, como disse Fábio, o narrador da
história, músico que na narrativa acompanhou Tim Maia durante muitos anos e que
também foi um dos afastados pelo excêntrico modo de ser do Rei do Soul. Modo
excêntrico que, ao fim de tudo, acabou isolando-o de todos aqueles que um dia
haviam gostado dele. Músicos, gravadoras, família, amigos. Tudo o que restava
era simplesmente a sua genialidade, que acabou levantando-o sempre que tudo
parecia estar dando errado. Isso acontecia porque ele era especial (genial).
Simplesmente especial (genial). Assim como a sua alma, o que ela refletia- a sua
música- era algo único e inimitável.
Entre altos
e baixos em sua carreira, uma das cenas mais marcantes certamente é aquela em
que Tim Maia é encontrado pela polícia em sua casa delirando absurdamente após
o consumo de cocaína e chega até mesmo a pedir sua própria prisão. Todos esses
momentos de ascensão e decadência são acompanhados de uma excelente trilha sonora, que conta com vários
elementos de sua extensa discografia e que encaixam muito bem na narrativa, o
que demonstra o quanto de si ele colocava em suas composições.
Elementos
como Fábio e Janaína, vivida por Aline Morais, funcionam como uma síntese de
várias pessoas que viveram ao lado de Tim durante toda a sua vida, e que foram
agrupados de uma maneira genial e que muitas vezes serviram de inspiração para
as letras que ele compôs.
Tim Maia era
excêntrico. Egocêntrico. Inconsequente. Fanático. Mas acima de tudo, um gênio.
Ao final de
sua trajetória, Sebastião Rodrigues Maia, o Tião da Marmita, o Rei do Soul
encontrou algo que há tempos procurava: o sossego.
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